Sobre caminhos meio tortos, amizades nostálgicas e olhar
para trás.
Dizem que nossas escolhas nos definem. Não sei se consigo
conviver muito bem com esse fato, afinal, nem todas as escolhas até aqui foram
feitas inteiramente por mim. Sei que grande parte foi sim, mas... não sei. Sou
egoísta ao ponto de não querer ser responsável por tudo. Tenho a péssima mania
de querer olhar para trás o tempo inteiro e nem sempre isso me faz bem. Jurei
para tantas pessoas que algo seria eterno e acabou não sendo. Jurei que tantos
momentos seriam duradouros e acabaram se tornando apenas mais um conjunto de
lembranças que eventualmente eu desenterro por conveniência. Eu tinha tantas
certezas que hoje me pergunto como foram se tornar dúvidas... Acho que deixei o
tempo correr tão livremente e, quando me dei conta, ele já não estava mais lá.
Os momentos haviam terminado, as pessoas foram embora e o presente se tornou
passado.
Quando foi que tudo mudou tão rápido? Em que momento eu
me perdi? Não sei onde minha mente estava, não faço ideia de onde meu coração
se meteu. Achamos que sabemos que nada dura pra sempre. Confuso. Verdadeiro. Acredito
que tinha esse “achismo” em mim e só percebi isso agora. Estou escrevendo esse
texto porque um incômodo choque de realidade me pegou de surpresa. Uma amizade
de longa data me fez voltar a questionar algumas certezas idiotas. Temos consciência
de que as pessoas também vivem suas vidas e seguem em frente independentemente
se estamos presentes ou não, mas por egoísmo nos recusamos a acreditar. Sempre
pensamos: “ah, ela volta. Tudo sempre se resolve.” Mas... E se não for? E se
dessa vez foi diferente? Eu tinha certeza de que, mesmo distante, algumas
pessoas seriam eternas. Quando se conhece alguém há tanto tempo, é inevitável
criar esse sentimento de conforto para com a pessoa. Eu criei, sabe? Eu tinha
certeza absoluta de que não importava os caminhos, no final o destino seria o
mesmo. Algumas amizades parecem grandes demais para ter um fim. Acho que o que
mais me incomodou nessa história toda, não foi “a curva na estrada” em si. O
que me deixou um pouco perplexa foi o fato de que só eu me senti incomodada com
aquela realidade. Fomos grandes amigas sim, de anos, mas o fim não me incomodou
tanto quanto a sensação que se seguiu. Eu me senti sozinha no meio desse
sentimento. Fiquei me perguntando: será que eu sou a única que está achando
isso tudo muito esquisito? Os incomodados que se retirem? A amizade na qual eu
me refiro não era aquela necessária, entende? Não era uma amizade urgente. Pelo
contrário, era... Morna. Podíamos passar semanas sem nos falar e no final não
fazia diferença nenhuma. As risadas eram as mesmas, os sorrisos e a
fraternidade continuavam sempre lá. Parecia que por mais que a gente se
afastasse, a intimidade permaneceria ali e ambas sabíamos disso. Era bom, era
diferente, era morno.
Juro que não acreditava que algo tão sutil me tocaria
tanto. É nostálgico como eu me senti pequena diante todos esses pensamentos. Eu
senti... Saudade. Por mais que eu tentasse negar, por mais que meu orgulho
ferido gritasse e esperneasse, eu senti saudade. É ruim quando algo não parece
nem perto de ser recíproco, nos sentimos insignificantes.
O que eu estava falando mesmo? Ah, escolhas! Esse
sentimento cinzento chamado saudade me atingiu quando eu andava pelos longos
corredores da escola e meu olhar cruzou com o olhar dessa estranha conhecida.
Foi inesperado, quase atrevido. Em meio segundo, todos esses pensamentos disfarçados
de palavras cruzaram minha mente. Tento entender até agora o que aconteceu,
procuro pela maldita escolha que foi capaz de mudar tudo. Não acredito que
algum dia vou conseguir a resposta que eu quero. Quero tantas respostas
impossíveis e inalcançáveis, essa terá que se conformar em ser apenas mais uma
entre muitas.
O que aconteceu depois da troca de olhares? Dividimos um
sorriso cúmplice e cada uma voltou a seguir seu caminho por aqueles corredores.
Continuamos fazendo escolhas como todo mundo e esperamos não errar mais uma
vez, ou pelo menos encontrar o caminho certo no meio de estradas erradas. Acho
que em cada curva alguém novo e maravilhoso pode aparecer e mudar tudo, mas
também espero que, vez ou outra, apareça alguma visita inesperada como essa que
me faça abrir algumas portas já fechadas e me faça repensar um pouco. Nem todas
as pessoas precisam nos mudar radicalmente ou causar um estrago. Também não
precisamos sempre de alguém completamente novo. Nem sempre o velho é ruim, nem
sempre faz mal olhar para trás, foi bom perceber isso. O friozinho na barriga
que vem acompanhado da nostalgia pode ser bem agradável. Continuamos a nos
cruzar por ai, nos esbarramos ocasionalmente. O sorriso sempre continuou o
mesmo, sou bastante grata por isso. É claro que a saudade também faz questão de
marcar presença, seria estranho se não marcasse. Algumas vezes aparece grave e
dura ou até aguda e sutil. Mas de vez em quando, a saudade vez simplesmente...
Morna.